O surgimento de novos cantadores, a renovação das toadas e a gradativa substituição de tambores de madeira por instrumentos de plástico estão entre as transformações em curso nos últimos anos desde que o Tambor de Crioula foi registrado como Patrimônio Cultural do Brasil. Esses são apontamentos do parecer de revalidação do título conferido ao bem, cujo conteúdo está aberto a contribuições da sociedade por um prazo de 30 dias, que se encerra no dia 15 de fevereiro. Conforme determina o Decreto nº 3.551/2000, como o Tambor de Crioula já completou uma década como Patrimônio Cultural do Brasil, o bem passa agora por uma identificação de suas características na atualidade.
Inscrito no Livro das Formas de Expressão em 2007, o Tambor de Crioula do Maranhão é uma manifestação afro-brasileira que envolve dança circular, canto e percussão. Encontrado na maior parte dos municípios maranhenses, o Tambor é realizado em praças, ao ar livre e no interior de terreiros. Sem calendário pré-fixado, a manifestação é praticada principalmente em louvor a São Benedito. Marcada pelas dançadeiras ou coreiras, seguindo os baques do tambor, a dança ainda tem como destaque a umbigada ou punga – gesto de saudação e convite. Um conjunto de práticas que compõem a identidade de resistência da população negra maranhense.
Para a Revalidação do Título de Patrimônio Cultural do Brasil, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) elaborou, em parceria com pessoas e organizações diretamente envolvidas no Maranhão, parecer que identifica as transformações pelas quais passou o Tambor de Crioula. O documento faz uma comparação entre o momento do registro do bem e os anos posteriores, identificando aspectos culturalmente relevantes ou empecilhos à sua continuidade.
Ao término do prazo de 30 dias, as eventuais manifestações sobre os pareceres de revalidação serão enviadas à Câmara Setorial do Patrimônio Imaterial a fim de subsidiar a avaliação do bem registrado. A Câmara, por sua vez, manifestará sua decisão sobre a avaliação do bem e, por fim, o processo será encaminhado ao Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, que decidirá sobre a revalidação do título Patrimônio Cultural do Brasil da manifestação. Caso a revalidação seja negada, será mantido apenas o registro do bem como referência cultural do seu tempo.
Os interessados devem enviar as propostas por correspondência para o Departamento de Patrimônio Imaterial – Diretor – SEPS Quadra 713/913, Bloco D, 4º andar – Asa Sul -Brasília – Distrito Federal – CEP: 70.390-135. Ou, então, por correio eletrônico: dpi@iphan.gov.br.
Transformações e fortalecimento
O parecer reúne vários apontamentos. O primeiro deles diz respeito ao canto, considerando a preocupação a respeito do falecimento dos mestres cantadores mais antigos. “Mesmo reconhecendo que novos cantadores vêm surgindo no interior dos grupos, alguns detentores mencionaram a necessidade de incentivar a multiplicação de oficinas com jovens nas comunidades”, diz o parecer da revalidação, “buscando estimulá-los e identificar cantadores potenciais, sendo possível substituir os mais antigos que não permanecem mais em ação.”
Ainda segundo o documento, detentores identificaram a reduzida renovação das toadas nos últimos anos, já que “muitos jovens já não participam do canto, do toque e da dança no tambor”. Outra questão apontada pelo parecer é quanto à fabricação dos tambores: a produção de instrumentos de madeira diminuiu, levando à substituição por aqueles feitos em plástico de PVC (policloreto de vinila). O uso do plástico nesses objetos é identificado desde a década de 1970, mas essa forma de produção se acentuou nos últimos anos. “Apesar dessas vantagens, os detentores consideraram que a fabricação do tambor com PVC leva à possibilidade de ameaça de transmissão deste ofício aos mais jovens”, completa o parecer.
Por outro lado, o documento aponta o fortalecimento do bem, a partir do surgimento de novos grupos. Na década de 1970, havia um indicativo de 15 a 18 grupos distribuídos na capital São Luís, além de outros localizados em municípios como Alcântara e Rosário. Já na primeira metade dos anos 2000, durante o registro do Tambor, foram registrados 60 grupos em São Luís, Caxias, Pinheiro, Porto Rico e Carapió. E em 2018, por fim, havia 113 grupos na capital, além de outros 102 outras organizações em municípios do interior do estado. O crescimento indica a centralidade do Tambor para a identidade cultural e musical, memória social e práticas religiosas maranhenses.
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